Bem-vindo, meu amor, nosso soluço não é mais do choro, agora
é do riso, pelo excesso de alegria.
Deixe para trás os ossos dos homens que não souberam lhe
amar. Os ossos não têm olhos.
Deixe as despedidas ingratas, a avareza dos outros.
Deixe o que não traz mais lembrança; mentiras jamais
acalmam.
Não seremos prisioneiros da culpa e do remorso, não seremos
reféns das incertezas.
Incertezas envelhecem, as dúvidas não.
Você cria mistérios, sou mais vivo porque me questiona, sou
mais seu porque não para de me perguntar o que aconteceu.
Venha engolir vento comigo, inspirar o primeiro ar da manhã
da estrada, lavar as mãos no solzinho tímido.
Vem comigo, amor, cheira meu pescoço. É cheirando meu
pescoço que descobrirá se falo a verdade. O cheiro é minha confidência. Meu
cheiro tem o seu cheiro. Transpiro o que leio em sua pele.
Amar só traz simplicidade.
Amar só traz humildade.
Amar antes só me trouxe para perto.
Para aqueles que pensam que caso e me separo com facilidade,
você será minha contradição, a insistência da virtude, a volúpia dos sapatos.
E vamos rir de soluçar. Pois ninguém acreditou na gente, a
não ser a gente. Temos a vantagem da intuição, amor.
Você dormiu colada em meu corpo desde o início. E não
pedimos trégua, água, tempo.
Sua respiração me assobia, me canta, me compõe.
Você não escondeu nada de mim.
Você conversa comigo como se eu fosse seu próprio
pensamento.
Você já fez minha barba para sentir o quanto custa ferir meu
rosto.
Eu já penteei seus cabelos para sentir o quanto um nó puxa a
cabeça para baixo.
Bem-vindo, amor, nosso passado é o nosso futuro.
Você escolhe a roupa na última meia hora de sono. Eu me
visto de suas escolhas pelo resto do dia.
Bem-vindo, amor.
Brigaremos no supermercado para definir nossa janta. Faremos
festa ao descobrir um pequeno aumento no salário. Puxaremos assunto com os
garçons. Receberemos elogios de estranhos comovidos com nosso abraço e inveja
dos casais mais antigos. Tocaremos os pés na madrugada e ficaremos com vontade
de acordar. Encostaremos os braços nos filmes e ficaremos com vontade de
dormir. Jamais trocaremos de lado na cama. Dividiremos o jornal de domingo.
Gostaremos das mesmas coisas das vitrines. Seu número em meu telefone constará
como um segundo nome. Seus anéis estarão dentro de meus livros. Minhas mãos
estarão dentro de suas mãos.
Bem-vindo, amor.
Felicidade não é para ser vivida sozinha. Sozinha, ainda é
segredo.
A felicidade é uma denúncia. Vou denunciá-la com um beijo.
Denunciá-la para minha eternidade.
(Fabrício Carpinejar)
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